![]() | O infame neurocirurgião italiano Sérgio Canavero, que ficou conhecido por anunciar, em 2015, a possibilidade de realizar o primeiro transplante de cabeça em humanos, parece ter se inspirado em outro famoso neurocirurgião, o americano Robert Joseph White, que em 14 de março de 1970, junto a sua equipe, levaram dois pequenos macacos para uma sala de cirurgia. O neurocirurgião estava à beira de um experimento ambicioso, em desenvolvimento há décadas, bizarro, se não tirado diretamente de seu próprio delírio. |

O objetivo de Robert? Conectar a cabeça do Macaco A ao corpo do Macaco B, no que ele considerava um transplante de corpo inteiro. O objetivo final de Robert era um dia realizar essa cirurgia em humanos.
Embora perturbadora, a ideia de um transplante de corpo levanta questões éticas, biológicas e filosóficas, sobre a natureza da vida e os limites da ciência, que ainda são discutidas hoje.
Mas primeiro, será que isso é mesmo clinicamente possível? A cirurgia de Robert enfrentou vários obstáculos técnicos.
Por um lado, garantia a paralisia, já que nenhum médico, naquela época ou agora conseguia reconectar uma medula espinhal rompida.
Mas Robert, um neurocirurgião em atividade, acreditava que a cirurgia poderia salvar a vida de seus pacientes com lesões na medula espinhal ou doenças progressivas de mobilidade, como a ELA.
Esses pacientes frequentemente enfrentam falências de múltiplos órgãos e paralisia, então, com um transplante de corpo, ele esperava salvar suas vidas substituindo todos os órgãos de uma só vez. Mas a paralisia não era o único desafio.
Devido às suas altas demandas energéticas, as células cerebrais precisam de um suprimento constante de sangue oxigenado para sobreviver. No entanto, a cirurgia de transplante provavelmente interromperia o fluxo de oxigênio do cérebro por horas.
Mas Robert teve uma ideia. Quando o cérebro está frio, seu metabolismo desacelera e ele depende menos de oxigênio.
Experimentando em cães e macacos, Robert otimizou uma técnica de resfriamento cerebral em que o fluxo sanguíneo cerebral era seletivamente resfriado e interrompido, enquanto o restante do sangue do corpo permanecia aquecido e circulava.
Então, em 1964, Robert resfriou com sucesso o cérebro de um paciente humano com um tumor cerebral com risco de morte, colocando-o em "animação suspensa" a 11°C.
Enquanto normalmente a equipe cirúrgica teria apenas de 3 a 5 minutos para remover o tumor, com essa nova técnica, eles operaram por mais de uma hora sem causar danos.
O resfriamento cerebral revolucionou o campo da neurocirurgia e colocou Robert um passo mais perto de seu objetivo de transplante de corpo.
Mas essa visão estava repleta de sérias preocupações éticas. Que condições justificariam tal cirurgia experimental, que poderia resultar em dor debilitante e danos neurológicos? E quantos animais teriam que morrer para provar que era possível?
Na época, a bioética ainda era um campo emergente. No entanto, inúmeros críticos, incluindo muitos na comunidade científica, reconheceram a crueldade da pesquisa de Robert e se opuseram veementemente a ela.
Entretanto, Robert continuou a obter aprovação de agências como os Institutos Nacionais de Saúde. E em 1970, ele estava pronto para tentar um transplante de corpo de macaco.
Primeiro, o Macaco A recebeu vasos sanguíneos temporários, espirais de tubos plásticos que prendiam a cabeça ao corpo. Tubo plástico por tubo plástico, a equipe conectou o Corpo B à Cabeça A e esperou que o sujeito acordasse da anestesia.
O macaco acordou vivo, paralisado e extremamente angustiado. De acordo com a equipe, o macaco conseguia ver, cheirar, ouvir e até tentou arrancar um dos dedos dos médicos com uma mordida.
Robert sentiu que isso provava que a operação poderia funcionar.
O cérebro pareceu sobreviver a um transplante de cabeça e, com altas doses de medicamentos, pôde viver sem rejeição imunológica.
Em última análise, a rejeição imunológica causou a morte do macaco após nove dias. Jerry Silver, um especialista em regeneração de nervos cortados, chamou os experimentos de Robert em macacos de "bastante bárbaros".
Mas Robert havia realizado um transplante de corpo no Macaco A? Ou foi um transplante de cabeça no Macaco B?
A cirurgia levanta questões sobre a divisão mente-corpo que vêm sendo debatidas há milênios. Embora a neurociência moderna apóie o papel central do cérebro na construção de nossa consciência, descobertas sobre os neurônios intestinais e o microbioma sugerem que a resposta pode ser mais complexa.
Parte do "eu" reside fora da mente? O corpo e o cérebro são interligados por circuitos e sistemas de sinalização; então, o que se perde ao separá-los?
Durante a década de 1990, Robert planejou realizar a mesma operação em humanos e praticou em cadáveres em um necrotério. Ele esperava poder fazer uma cirurgia de transplante de cabeça no físico Stephen Hawking e no ator Christopher Reeve.
Como neurocirurgião, Robert realizou mais de 10.000 cirurgias cerebrais antes de se aposentar em 1998, mas nunca o transplante de cabeça humana com o qual sonhava.
Desde então, vários cientistas demonstraram interesse em retomar o trabalho de Robert, reacendendo debates inacabados.
Mesmo que um médico conseguisse conectar com sucesso a cabeça de um paciente ao corpo de um doador, qual dos dois sairia vitorioso? E prolongar a vida sempre vale o custo?
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