![]() | Durante o século XVII, um vasto assentamento autônomo chamado Palmares atingiu seu auge no nordeste do Brasil. Foi fundado e liderado por pessoas que escaparam da escravidão, também chamadas de quilombolas. Na verdade, era uma das maiores comunidades quilombolas do mundo, com uma população que ultrapassava 10.000 habitantes. E seus cidadãos estavam em constante guerra com as forças coloniais. Os registros que temos sobre Palmares vêm principalmente de fontes holandesas e portuguesas tendenciosas, mas historiadores conseguiram reconstituir pelo menos parte de sua história. |

Durante o tráfico transatlântico de escravos, iniciado no século XVI, quase metade de todos os africanos escravizados foram enviados para a colônia americana de Portugal: o Brasil.
Alguns escaparam e buscaram abrigo no interior do Brasil, onde formaram assentamentos chamados mocambos ou quilombos. Fugitivos da escravidão provavelmente chegaram ao nordeste no final do século XVI.
Na década de 1660, seus acampamentos se consolidaram em uma poderosa confederação conhecida hoje como Quilombo de Palmares. Consistia em uma capital central que ligava dezenas de aldeias, especializadas em produtos agrícolas específicos ou que serviam como campos de treinamento militar.
Os cidadãos de Palmares, ou palmaristas, eram governados por um rei e defendidos por um exército organizado. Africanos, negros e indígenas nascidos no Brasil, todos buscavam refúgio ali.
Eles pescavam, caçavam, criavam gado, plantavam pomares e cultivavam culturas como mandioca, milho e cana-de-açúcar. Eles também utilizavam as abundantes palmeiras que deram nome a Palmares, transformando produtos derivados da palma em manteiga, vinho e luz.
Os palmaristas transformavam as cascas de palmeira em cachimbos e as folhas em esteiras e cestos. Eles trocavam alguns desses bens com os colonos portugueses por produtos como pólvora e sal.
Por sua vez, os colonos evitavam os ataques de Palmares, durante os quais apreendiam armas e faziam prisioneiros. Os portugueses estavam preocupados com outros imperialistas invasores, mas consideravam as revoltas indígenas e Palmares como suas ameaças internas. Palmares colocava em risco a própria instituição da escravidão, a base da economia do Brasil.
Durante a década de 1670, os portugueses intensificaram seus ataques. Nessa época, Ganga-Zumba ("grande senhor" em Quimbundo) era o líder de Palmares. Filho de uma princesa do Reino do Congo, liderou a comunidade quilombola, tendo seu palácio principal chamado "Macaco" em homenagem a um animal morto no local.
Seus aliados e familiares governavam as outras aldeias, com as mulheres desempenhando papéis cruciais na operação e na defesa.
Enquanto lutavam contra os portugueses, os palmaristas usavam a paisagem a seu favor. Camuflados e construídos em lugares altos, seus mocambos ofereciam mirantes superiores.
Construíram valas escondidas, ladeadas por estacas afiadas que engoliam soldados desavisados, e estradas falsas que levavam a emboscadas.
Lançaram contra-ataques sob o manto da noite e estavam constantemente abandonando e construindo assentamentos para iludir os portugueses.
Em 1678, após anos de ataques fracassados, os portugueses se ofereceram para negociar um tratado de paz com Ganga-Zumba.
Os termos acordados reconheciam a independência de Palmares e a liberdade de qualquer pessoa nascida lá. No entanto, o tratado exigia que Palmares jurasse lealdade à coroa e devolvesse todos os fugitivos da escravidão, passados e futuros.
Muitos palmaristas discordaram, entre eles Zumbi, ex-Francisco, sobrinho de Ganga-Zumba, um líder em ascensão. Mas Ganga-Zumba assinou o acordo de paz com os portugueses, que previa a mudança do povo para o Vale do Cucaú.
O acordo gerou descontentamento e uma revolta liderada por, Zumbi. Logo após a assinatura do tratado, Ganga-Zumba foi envenenado, possivelmente por seus próprios seguidores, em meio à crescente oposição à rendição.
Como novo líder de Palmares, Zumbi rejeitou o tratado e retomou a resistência por mais 15 anos. Mas em fevereiro de 1694, os portugueses capturaram a capital após um cerco devastador, liderado por Domingos Jorge Velho, um bandeirante temido por sua brutalidade ao caçar indígenas e escravizados fugitivos das mãos dos portugueses. Por dias, a batalha devastou a mata, deixando feridos e mortos de ambos os lados.
Zumbi foi ferido, mas não se rendeu e escapou, mas a maior ameaça não veio das armas, mas da traição de um homem chamado Antônio Soares, um dos quilombolas, que entregou o paradeiro de Zumbi aos portugueses em troca de ouro e perdão. Em 20 de novembro de 1695, zumbi foi cercado e capturado, sua luta chegando ao fim quando seu corpo foi decapitado e exibido como troféu em Recife.
Sua morte não foi o fim de Palmares, mas foi um golpe devastador. Após anos de guerra, havia muito menos rebeldes na área.
Os que permaneceram se uniram em torno de novos líderes e mantiveram uma presença, ainda que pequena, ao longo da década de 1760. No entanto, Palmares não existe mais, milhares de outros quilombos persistem até hoje.
Os quilombos atuais são comunidades que preservam a cultura e tradições de seus ancestrais, mas também enfrentam desafios como a falta de titulação de terras, o que afeta a segurança e a subsistência dessas populações.
Existem comunidades quilombolas rurais e urbanas, e a luta pela terra é uma questão central, embora o processo de regularização fundiária seja lento e complexo.
Essas comunidades, que somam cerca de 1,3 milhão de pessoas no Brasil, buscam garantir direitos e políticas públicas que reconheçam sua existência e modelem ações em diversas áreas, como educação e saúde.
Ironicamente, minha cidade natal no sul de Minas tem um bairro retirado chamado Quilombo, que era um quilombo no passado, mas hoje é habitado por pessoas abastadas em suas mansões.
20 de novembro, dia da morte de Zumbi, é comemorado em todo o Brasil como o Dia da Consciência Negra. Mas Zumbi foi apenas um entre muitos palmaristas. Só conhecemos alguns de seus nomes, mas sua luta pela liberdade ecoa séculos depois.
As principais distorções históricas sobre Zumbi dos Palmares incluem a ideia de que ele possuía escravos nos moldes coloniais, a afirmação de que era um líder tirânico e violento, e a narrativa de que ele e seus guerreiros escolheram o suicídio em vez da rendição.
Essas narrativas, muitas vezes impulsionadas por discursos colonialistas e tentativas de desqualificar o movimento negro, são desmentidas por evidências históricas que retratam Zumbi como um herói da liberdade que lutou contra a escravidão imposta pelos portugueses, e o Quilombo de Palmares como um símbolo de resistência.
Embora tenham matado o corpo de Zumbi, nunca conseguiram apagar seu legado. Zumbi é mais do que um nome ou uma data no calendário. Ele é símbolo da resistência, da coragem de lutar contra um sistema injusto e da luta constante pela liberdade e igualdade.
Hoje, seu espírito vive nas batalhas cotidianas contra o racismo e a desigualdade no Brasil. Seu legado inspira milhares a continuarem lutando, lembrando que a verdadeira liberdade não é um presente, mas uma conquista.
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