Como criar um engana-bobos

Se você é um jovem empreendedor que está buscando uma ideia de negócio que requeira um mínimo esforço e que gere grandes ganhos e se ademais está com vontade de ganhar o mundo, mas sem nenhum projeto atual que valha a pena e também não é cara de pau o bastante para ser o pastor da própria igrejinha. Seus problemas acabaram!

Este é o momento e o lugar adequado. O Brasil é um país de misticismos e crenças absurdas, e isso é uma oportunidade de negócio que um empreendedor talentoso como você não pode deixar escapar. Com este singelo guia poderá colocar em marcha seu negócio em somente 10 passos.

1. Crie um produto qualquer -uma pomada, uma pulseira, uma água engarrafada- e escreve um panfleto repleto de palavras científicas concatenadas. Não se preocupe por dotar de algum sentido, seu consumidor potencial é analfabeto funcional. Há palavras que funcionam de maneira mágica como energia e magnetismo; use sem nenhum pudor.
2. Outra opção é inventar sua própria palavra pseudocientífica, como polimunidadiva ou pendorfinas. É fundamental que o vocábulo que crie tenha uma verdadeira ressonância científica.
3. É importante que avalize seu produto com algum álibi "natural", que ninguém pense que foi desenvolvido em um escuro laboratório de um porão sem janelas repleto de gente feia. Pode afirmar, por exemplo, que seu produto se baseia em algo oriental e milenar -não pode ser somente oriental ou somente milenar, devem ser ambas as coisas-. Se você não gosta da desculpa oriental, diga que é baseado em algo aparentemente inócuo, mas extravagante como a mucosidade vaginal das morcegas.
4. Tenha muito cuidado quando afirmar para o que serve exatamente seu produto. Deve dar a impressão de que é a resposta para a cura de algo, mas não pode colocar explicitamente o que ele cura ou corre o risco de acabar na cadeia. Use expressões ambíguas e vagas; diga, por exemplo, que endurece os átomos ou que dilui a entropia de seus quarks ou que apura a áurea magnética da glândula pineal. E coloque em negrito.
5. Agora deve estabelecer uma boa distribuição para seu produto. Todos os agrupamentos humanos que superam os mil habitantes têm ao menos uma dessas lojinhas vagabundas que vendem produtos biológicos junto aos inócuos remédios homeopáticos. Obviamente, você deve colocar seu produto ali, mas não se limite a isso. As farmácias são também lugares fantásticos para distribuir um engana-bobos. Talvez você ache que há uma lei que proíba a venda deste tipo de produtos em farmácias. Pois se existe, ninguém segue. Farmácia hoje em dia só não vende a mãe.
6. Presenteie seu produto a uns quantos famosos do tipo Barrichello ou qualquer um destes que aparecem nas novelas; quase todos carecem de formação científica -só conhecem razoavelmente de quimíca da mistura do pó- o que é uma vantagem para você. Convence-os dos benefícios terapêuticos de seu produto e garanta que ficarão ainda melhores de cama -como todo mundo sabe, quando entropia dos quarks são diluídas, temos um aumento diretamente proporcional da potência sexual-.
7. Quando alguém perguntar por que seu produto não está homologado pelo Ministério da Saúde -e pode ter certeza que, tarde ou cedo, um babaca inteligente vai fazer isso-, responda que há um lobby da indústria farmacêutica e da OMS que pressiona o Governo a não aprovar o seu produto. Se, apesar de sua explicação, a pessoa em questão pedir mais explicações, responda: "Você é do tipo que acha que o 'onze de setembro' foi feito pela Al Qaeda, né? Tsc... tsc... tsc...". Balance a cabeça, olhe-o com arrogância e desprezo e mude de assunto ou dê as costas e diga que não falará mais sobre o assunto com quem desconhece totalmente os princípios de Heinsenberg, Rosemberg, etc.
8. Os grandes meios de comunicação têm uma seção de ciência para preencher, mas estão precisando de jornalistas capazes de diferenciar um brontossauro do Hubble. Aproveite esta feliz circunstância para que publiquem um artigo sobre seu produto.
9. É importante que apresente seu produto com algum tipo de pesquisa científica que o avalize e que tenha sido realizada por um centro universitário. Você tem duas opções. A primeira e mais barata é inventar a Universidade. Compre um guarda-pó branco para seu cunhado e faça uma foto sua manipulando o produto enquanto olha a câmera. Isto tem seus riscos, já que poderia ser acusado de publicidade enganosa, de modo que existe uma opção mais cara: com a merreca que pagam para os professores universitários nesse país não deve ser muito difícil encontrar um que aceite dinheiro para fazer uns poucos relatórios favoráveis ao seu produto. O investimento valerá a pena, além de que levará mais uma ou outra família a inclusão financeira.
10. Por último, reze para que o governo continue a tratar a educação como uma opção secundária de forma que essa grande massa analfabeta chamada consumidor continue não sabendo nada de ciência.